Cada um irá ler e analisar o resultado da eleição com suas razões. Ou,
com o fígado. Mais com o fígado do que com razões, muitos apostaram que Lula
seria derrotado em São Paulo. Lula bancou sua maior aposta. E ganhou com
Fernando Haddad na maior e mais poderosa cidade do Brasil.
Toneladas de papel, centenas de horas e horas nas rádios e TVs, bits e
mais bits foram gastos para explicar como e porque Lula seria inexoravelmente
derrotado. Se tivesse perdido, choveriam manchetes sobre a "estrondosa
derrota", análises infindas brotariam com erros que teriam levado à
"derrota monumental".
Já os números são inequívocos: o PT e o PSB saem da eleição com mais
prefeituras e mais eleitores. Juntos, conquistaram 31% dos eleitores e 1.076
das prefeituras do Brasil. O PMDB, que encolheu, mesmo assim venceu em 1.026
cidades. Somente estes três partidos da base da presidente Dilma, PT, PMDB e
PSB, governarão 2.102 das 5.556 cidades. E governarão 48% dos eleitores do
Brasil.
Eduardo Campos (PSB) sai forte, fortíssimo das urnas. Pode seguir com
mais espaço no governo Dilma, e pode começar a ensaiar seu voo solo. Não
faltará quem queira o governador de Pernambuco em duetos, tercetos…
Aécio Neves (PSDB), no primeiro turno, também venceu. É paradoxal, como
costuma ser a política, mas Aécio ganha espaço com a derrota de José Serra. Não
há quem não saiba que os dois tucanos não se bicam.
José Serra perdeu para um conjunto de fatores: fadiga de material, má
avaliação do prefeito Kassab, erros na campanha… mas Serra perdeu também para
si mesmo.
Serra perdeu porque costuma subestimar os demais. Porque imagina, quase
sempre, que "o outro" é um inimigo, seja o "outro" quem
for. E essa é uma equação que não fecha. Menos ainda na política, onde a conta
sempre chega.
Lula, Dilma e o PT perderam batalhas. Em Salvador, Campinas, Fortaleza,
Porto Alegre, Recife… e outros tantos cantos. Como também perderam Eduardo
Campos e Aécio Neves. Mas, é fato, eles venceram suas batalhas simbólicas.
Kassab e seu PSD ganharam 497 prefeituras… mas perderam a poderosa São
Paulo, um símbolo com 6% do eleitorado do país.
Perderam os que superestimaram e apostaram em efeitos imediatos do
julgamento no Supremo Tribunal Federal.
O chamado "mensalão" é um conjunto de fatos objetivos. De
fatos graves, ou gravíssimos.
Mas não funcionou magnificar o “mensalão” ainda mais. Não funcionou
fazer de conta que o "mensalão" é caso único e isolado na vida
político-partidária brasileira.
O Brasil tem hoje 80 milhões de usuários na internet e 50 milhões usam
redes sociais no cotidiano. Portanto, milhões e milhões de pessoas ouvem falar
de outros escândalos, alguns monumentais. Esses escândalos não chegam às
manchetes. Muitas vezes mal são noticiados, ou, nem são noticiados na chamada
grande mídia. É como se tais escândalos não existissem.
Talvez por isso, mesmo com a gravidade do caso "mensalão", 20%
dos eleitores do Brasil se abstiveram; em São Paulo, incluídos os nulos, o
número bate nos 30%.
É muito, pode ser mesmo significativo de algo, mas quem é do ramo, como
José Roberto de Toledo, de O Estado de S.Paulo, recomenda cautela: tais números
precisam ser revistos à luz de uma atualização de cadastros; entre mortos e
etc., a conta pode não ser exatamente esta.
Mas, fato objetivo, o “mensalão” não deu a vitória para quem se valeu do
julgamento como arma e discurso principal na campanha.
O porque desse descompasso entre uma causa, “o mensalão”, e o que tantos
buscaram, os efeitos imediatos, para esta eleição, é coisa para pesquisadores,
sociólogos e demais "ólogos". Mas cabem alguns raciocínios mais
simples.
Por exemplo: das 5.556 cidades do Brasil, 70% têm menos de 20 mil
habitantes (com 17% do eleitorado). Seus moradores, portanto, conhecem, sabem
“quem leva" e "quem não leva". E sabem que o "levar"
é, infelizmente, multipartidário.
O mesmo sabem moradores de milhares de cidades com dimensões que ainda
permitem saber quem é quem. Ou, “quem leva” e “quem não leva”. Talvez por isso
o ex-governador de São Paulo Claudio Lembo (PSD) – que não é um perigoso
esquerdista – tenha feito uma importante, intrigante pergunta depois da
eleição:
- Os brasileiros estão afastados dos valores éticos, ou os eleitores se
consideraram manipulados pelos mecanismos (os meios) de informação?
Diante do que se viu, se leu e se ouviu antes e durante as eleições,
cabe uma constatação: em muitas porções do Brasil, e mais uma vez, a opinião
pública derrotou a opinião publicada.
FONTE: Terra Magazine