Sob o título “Prendendo mais Pobres, eis a fórmula”, o artigo a seguir é de autoria de Andre Luis Alves de Melo, Promotor de Justiça em Minas Gerais, Mestre em Direito Público e Doutorando pela PUC-MG.
O número de presos aumentou de 300 mil em 2003 para 500 mil em 2013, ou seja, mais de 70% em dez anos, conforme dados do DEPEN [Departamento Penitenciário Nacional, órgão do Ministério da Justiça). Mas nada se fala sobre isto.
A fórmula para este “desempenho” é muito simples: policiais escolhem o que irão apurar a autoria, os promotores são obrigados a processar (obrigatoriedade da ação penal ou da denúncia) e o próprio Estado faz a defesa, o que acaba por agilizar os processos e as condenações.
Assim, os policiais apenas apuram autoria de crimes menos inteligentes que não exigem investigação, geralmente furtos e roubos de pequenos objetos ou tráficos em pequenas quantidades com prisões em flagrante, normalmente cometidos por pessoas mais pobres ou com menos estudos. Por isto, alguns acham que apenas pobres cometem crimes e se der estudo não vão cometer crimes. Na verdade, ricos e estudados também cometem, mas a autoria ou o fato não é apurado e tudo fica impune, como nos estelionatos (golpes) e crimes de colarinho branco.
A defesa em casos de crimes com prisões em flagrante e por crimes menos inteligentes como furtos acaba tendo um papel apenas de tentar diminuir a pena, mas geralmente os juízes já aplicam a pena mínima, então a solução é discutir a obrigatoriedade da acusação e a possibilidade de acordos para penas alternativas, mas isto reduz o mercado de trabalho para a defesa, logo não há muito interesse neste modelo que prevalece na Europa e nos Estados Unidos, e até mesmo na Argentina e Paraguai.
Precisamos discutir temas como prioridades para investigação criminal, fim da obrigatoriedade da ação penal e a estatização da defesa como monopólio estatal, o que não existe em nenhum país. Mas, para alguns setores quanto mais processos e mais presos melhor, pois pedem mais recursos para o governo e até mesmo apoio de organismos internacionais.
No Brasil estamos no paradoxo de privatizar a execução da penal para ONGs como as APACs [Associações de Proteção e Assistência aos Condenados] e empresas, mas a defesa tem que ser estatal. Isto inverte todo o papel, pois defender não é atividade privativa do Estado, mas a execução da pena sim. Vivemos sob o caos no meio penal e por isto a criminalidade cresce, uma vez que falta racionalidade ao sistema, o que agravou nos últimos dez anos. Vivemos sob a concepção de um Estado Policial em vez de Estado Democrático de Direito.
Flexibilizar a obrigatoriedade da ação penal para delitos de furto geram mais resultados na diminuição de prisões do que investir na defesa, mas o discurso atual é o contrário, embora não tenha gerado efeitos tem sido um ótimo negócio para a defesa e para quem presta serviços jurídicos e outros ligados ao sistema penal e prisional.
Caso contrário, os furtos de galinhas continuarão a ser prioridade, pois mais fáceis de apurar e processar, o que acaba sendo um modelo de gestão da miséria.