Para quem aspira ardentemente uma
posição social melhor no quesito concurso público, vale a leitura do artigo de
Luiz Fabre, publicado originalmente na Revista Carta forense do dia 02/06/2014,
que pode ser consultada na integra aqui. Ou através do que foi copiado e colado
na totalidade a seguir:
por Luiz Fabre
Em que momento decidiu se enveredar pelos concursos públicos?
Quando senti que as grandes chances haviam rareado na minha carreira como advogado e a minha qualidade de vida havia se deteriorado com a ansiedade decorrente. Ao mesmo tempo, fui forjado acreditando no Estado de Direito; é, para mim, a mais importante conquista da humanidade. Com o passar do tempo, percebi o potencial transformador da função pública e a vontade de servir ao interesse público me dominou.
Quando iniciou seu preparo? Qual metodologia usou?
Iniciei o preparo cerca de três meses após a graduação, quando abriu um concurso para a procuradoria do município de São Paulo. Só estudei pelas sinopses da Saraiva e Maxmilianus Führer, fazendo resumos. Neste primeiro concurso eu fiquei há “apenas” uns dez pontos do corte da 1ª fase. Pensei: dá para arriscar. Desliguei-me do escritório onde advogava achando que em pouco tempo atingiria meu objetivo. Só depois vim a descobrir duas regras sobre concursos: a) em concursos cuja nota de corte é baixa, “dez pontos” é muito, muito ainda por estudar; b) em concurso, a meta deve ser a nota máxima, não desistir de nenhuma mísera questão objetiva, ainda que tenha que deixa-las para o final e ser o último a entregar. Mesmo em provas do tipo “tantas erradas anulam uma certa” não devemos desistir precipitadamente de nenhuma questão. Prestei cerca de 15 concursos na vida, fui aprovado em 5 (procurador da fazenda nacional, procurador do município de SP, procurador do estado do Ceará, juiz federal na 3ª Região e procurador do trabalho). Meu método foi o de acumular experiência em provas; estudar por escrito, com boa caligrafia e sempre; estudar até passar e estudar para passar. Comecei pelas Sinopses e, no ápice, cheguei a Canotilho. Ah, e sempre que era reprovado, tirava uma noite para ver algum filme inspirador, e retomava os estudos no dia seguinte, para expiar minha frustração.
Quanto tempo demorou para ser aprovado no primeiro concurso?
Comecei a prestar em março de 2002 e minha primeira aprovação foi por volta de julho, agosto de 2003, para o excelente cargo de procurador da fazenda nacional. Alguns dizem: “nossa, que demorado!”. Calma; lembrem-se que iniciei quase do zero, academicamente; você, não demorará necessariamente esse tempo todo. Outros dizem: “nossa, que rápido!”. Talvez cronologicamente rápido, mas neste interstício, até onde me recordo, prestei e fui reprovado (mas minhas notas e chances progressivamente aumentavam) nos seguintes certames: PGMSP, PGESP, PGE RJ, TRT2, TRT15, TJESP, MPSP, AGU, Procuradoria Federal... Isso tudo me proporcionou grande autoconhecimento.
O Ministério Público do Trabalho sempre foi seu foco principal?
Não, durante a faculdade queria ser advogado ou juiz de direito; aliás, pouco se falava sobre o universo temático do MPT na Faculdade, essa é uma carreira nova, com um perfil em construção, com muitas áreas a serem desenvolvidas. Francamente, acho que nem sempre alguém recém-formado, neófito, possui compreensão da sua vocação, ainda mais quando premido pela situação de desemprego, posto que voluntário. Mantive a mente aberta a todas as possibilidades e só me apaixonei pelo MPT bem depois.
O senhor sofreu alguma cobrança de familiares e amigos pelo resultado pretendido?
Claro que sim, ainda que implícita. Essa é a vida, uma estrada dura. Viver é lutar. Essas cobranças não importam; nenhuma é mais pesada do que a que você se impõe. Superações são inerentes ao aprendizado de vida. Prestem atenção nisso, por favor: há pessoas ricas que passam, há pessoas pobres que passam; há pessoas que só estudam, há pessoas que estudam e trabalham, há pessoas que estudam, trabalham e têm filhos; há casados, há solteiros; graduados nas melhores escolas e aqueles que vieram da roça e foram o primeiro da família a obter grau superior; há deficientes visuais, deficientes físicos que passam; pessoas jovens, pessoas idosas... Perdoe-me o lugar-comum, mas é verdade: tudo que importa está dentro de você; só depende de você e mais ninguém!
Depois de aprovado, como foi sua rotina de Procurador do Trabalho recém empossado?
A melhor que jamais imaginei. Fazer o bem, só pensar em fazer o bem, lutar para melhorar o País. Há muito o que se dizer, mas não caberia neste espaço. Há algumas coisas na vida a respeito das quais idealizamos, e ao chegarmos lá, as expectativas não correspondem à realidade e nos frustramos; há algumas coisas cujas expectativas se confirmam, e isso é bom; mas há coisas que idealizamos e, na prática, superam nossas expectativas, são ainda melhores do que imaginávamos. Na minha opinião, a carreira de procurador do trabalho enquadra-se nesta terceira categoria. Não sei se essa sensação perdurará para sempre, mas é como me sinto atualmente, com sete anos de MPT.
Quais são as atividades que um Procurador do Trabalho exerce? Como é a rotina profissional?
O procurador do trabalho soluciona problemas do mundo do trabalho, ele não os passa adiante. São problemas de grande repercussão econômica: evitar que o trabalho escravo contamine um setor inteiro da economia, buscar soluções pelo trabalho para o jovem da periferia, democratizar as relações sindicais, evitar mortes em obras e combater a favelização inerente ao aliciamento de trabalhadores para grandes obras, proteger o empregador cumpridor da legislação da competição desleal daqueles que a descumprem, garantir a oportunidade de todos no mercado de trabalho e proteger a dignidade de todos nesse mercado, tutelar centenas de vítimas de uma contaminação química em uma fábrica, integrar povos pelo trabalho. A maioria dos casos são solucionados extrajudicialmente, através de articulação social, termos de ajuste de conduta, audiências públicas, notificações, reuniões, requisitando abertura de procedimentos a tribunais de contas, ao Ministério do Trabalho e Emprego. Havendo necessidade, manejamos ações civis públicas. Particularmente, gosto muito é de implementação de políticas públicas.
Qual foi o momento mais engraçado ou curioso da sua carreira até agora?
Ri bastante uma vez em que oficiava na saudosa Londrina. Havia uma complexa greve de motoristas de ônibus e, à noite, jogo final da Copa do Brasil com o meu time de coração. Na manhã seguinte, no caderno sobre cotidiano, havia uma reportagem sobre a greve com declarações e uma foto minha conduzindo uma sessão extrajudicial, todo elegante de terno. No caderno de esportes, a manchete era a festa que os torcedores fizeram na Avenida JK pelo título (nossa torcida é a maior de Londrina), e num cantinho da foto lá estava eu anonimamente, pulando feito um louco. Há muitas histórias engraçadas.
E o mais triste?
Mais triste são sempre os casos de trabalhadores adoecidos, acidentados, morte de trabalhadores, trabalho infantil, resgate de escravos, tráfico de pessoas... O garotinho filho de pais bolivianos que morreu assassinado me comoveu bastante, pois estou muito envolvido em trabalho de imigrantes em São Paulo.
E o mais feliz?
Uma senhora bem enferma que ajudamos em uma operação. Depois ela escreveu, dizendo que havia sonhado conosco, e que meus colegas e eu chegávamos como anjos no local de trabalho dela.
O que deve esperar o concursando na hora de optar pela carreira no Ministério Público do Trabalho?
Muito trabalho e muita viagem, principalmente no começo. Fazer apenas a sua parte na sociedade e não fazer nada é quase a mesma coisa. Precisamos daqueles dispostos a fazerem sua parte e a parte de muitos outros. Precisamos mudar este País.
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