DAIENE CARDOSO - Agência Estado
Especialistas em
Direito Constitucional veem com preocupação os constantes comentários públicos
de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o julgamento do mensalão e
o imbróglio envolvendo a suposta interferência do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva junto ao ministro Gilmar Mendes para adiar o julgamento do caso.
Advogados ouvidos pela Agência Estado avaliam como negativa a superexposição
dos ministros, uma vez que, tradicionalmente, um magistrado só se pronunciaria
nos autos processuais. Os especialistas afirmam que, ao se manifestarem
publicamente, os ministros dão indicações de como devem votar, abrindo assim
espaço para interferências externas.
"Acho que (o
julgamento do mensalão) já está contaminado. As pessoas já conhecem os votos
pelas manifestações e entrevistas que dão e não deveria ser assim",
avaliou Dirceo Torrecillas Ramos, presidente da Comissão de Direito
Constitucional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O professor de Direito
Constitucional da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Oscar Vilhena afirma que o
modelo onde os ministros se preservam de comentários públicos, como acontece na
Corte dos Estados Unidos, é mais positivo. "O ritual do nosso Supremo está
esgarçado. É inadequado que as pessoas falem tanto assim", observou.
Vilhena lembra que nos bastidores, os magistrados conversam entre si sobre os
processos o que, em sua opinião, seria saudável. "Nas boas Cortes os
juízes se ouvem, reservadamente conversam. Hoje a gente ouve essas conversas em
público", comentou.
O advogado Tércio
Sampaio Ferraz explica que a "regra social" do Direito recomenda que
as partes envolvidas nos processos (juízes, promotores e advogados) só falem
através dos autos, mas ressaltou que o comportamento nos tribunais mudou nos
últimos anos. "Falar fora do processo vem se tornando quase usual para
todos os agentes. Isso se tornou mais agravado desde a transmissão online direta
das sessões do STF, criando uma exposição de todos os julgadores e
participantes do julgamento", contou.
Para Ramos, ao
seguir a "regra social" do Direito, o magistrado dá sinais de
comprometimento com um julgamento isento e não influencia os colegas de Corte.
"Eles não deveriam fazer comentários, deveriam falar só nos autos e
cumprir assim sua função com independência. Na medida em que comentam, eles
tomam uma decisão política", acrescentou Ramos.
Os advogados dos 38
réus acusados de envolvimento no mensalão poderão argumentar que, ao fazer
declarações públicas, os ministros do STF fizeram antecipação de juízo, o que
poderia impedi-los de julgar. "Os advogados podem criar obstáculos, mas
não acho que isso poderia ser acolhido (pelo STF)", disse Ferraz. Os
especialistas não acreditam que a suposta tentativa de interferência do
ex-presidente Lula junto ao ministro de Gilmar Mendes deixe-o de fora do
julgamento por estar envolvido na polêmica. "Isso dificilmente vai
ocorrer", previu Ramos.
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