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"Esperou-se, em vão, durante os últimos anos o “grande erro” que faria cair a máscara daquele que nunca poderia ter sido! E a ordem natural estaria restabelecida. A grande mídia teve e tem papel crucial de reforço dessa negação e expectativa, pois reverbera pela classe média o sentimento geral das camadas privilegiadas que sofrem esse estranhamento. A palavra que melhor define esse estado de coisas é preconceito."
Estou de férias. Semana passada fui ao Marrocos e senti orgulho de ser brasileiro.
Umas das excursões que fizemos foi para o deserto do Saara. Havia gente de todo canto do mundo. Durante o trajeto cada um dos turistas do ônibus se apresentou, dizendo o nome e a nacionalidade. Quando chegou nossa vez eu disse que eu e minha noiva éramos brasileiros e, para nossa surpresa, recebemos, espontaneamente, uma salva de palmas. Fomos os únicos!
Com o passar do tempo fui interagindo e procurando saber qual a imagem que tinham aqueles estrangeiros do Brasil. Em particular os europeus salientaram a pujança econômica atual, a copa e as olimpíadas, embora um deles ainda tenha falado em favelas e em pobreza. O nosso presidente é muito mais conhecido e respeitado aqui do que eu imaginava. Um holandês elogiou sua postura na luta contra a fome e em defesa da paz. Houve curiosidade em relação à história de vida dele por parte de um casal de Hong Kong.
Quando voltei a Portugal, fui fazer uma pesquisa nos principais veículos de comunicação daqui. Todos salientando a liderança do nosso Chefe de Estado nas negociações com o Irã. Bem diferente do negativismo que apregoa a grande mídia brasileira, oriunda da região mais rica do nosso próprio país.
Passei a refletir sobre esse nordestino que migrou num pau-de-arara para o Sul Maravilha, em busca de oportunidades. Tenho um primo que morou no Itaim Bibi, na Zona Sul de São Paulo e recordo que todos os porteiros do prédio eram nordestinos. Na vizinhança era bem fácil reconhecer em cada uma das casinhas que abrigavam a portaria dos edifícios de luxo aquele biotipo mestiço, baixo e de cabeça-chata, que se expressava com constantes erros de concordância. Tendo em vista os estereótipos que povoam nosso imaginário, bem poderia ser hoje o nosso presidente um daqueles porteiros... Por isso algo não estaria no lugar. No lugar de sempre. No lugar-comum. Talvez isso explique o estranhamento de boa parte das classes média e alta, principalmente no eixo Sul-Sudeste.
Embora o discurso que assumimos é o de que não temos racismo e nem preconceito contra grupos no Brasil, é indisfarçável o desconforto a muitos senhores e senhoras letrados, intitulados “doutores”, porque um reles torneiro mecânico – ainda por cima um nordestino migrante – represente o Estado brasileiro. O nosso imaginário talvez ainda não esteja preparado para isso: a figura de um líder como ele, um outsider. Nesse ponto vejo em parte o mesmo acontecendo com Obama em relação à grande mídia conservadora americana. O caminho mais fácil, então, é a negação dos seus acertos, aclamação dos inevitáveis erros e a projeção nele do sintoma da quebra dessa idealização, reforçando o estigma, ainda que racionalmente deslocado da realidade.
Esperou-se, em vão, durante os últimos anos o “grande erro” que faria cair a máscara daquele que nunca poderia ter sido! E a ordem natural estaria restabelecida. A grande mídia teve e tem papel crucial de reforço dessa negação e expectativa, pois reverbera pela classe média o sentimento geral das camadas privilegiadas que sofrem esse estranhamento. A palavra que melhor define esse estado de coisas é preconceito.
A quebra de alguns paradigmas dos padrões de cultura que compramos dos países centrais é bom para crescermos enquanto indivíduos e, principalmente, nação. Fortalecerá nossa identidade, para seguirmos nosso próprio caminho, independentes, finalmente, do julgo da cultura e dos interesses dos Estados mais poderosos.
E esse homem representa não só o biotipo, mas a identidade da maior parte do nosso povo e é a vitrine do nosso país no mundo. Reconheço o papel dele nos aplausos que recebemos no ônibus.
Os americanos são muito orgulhosos do seu país, o mesmo que causou a grande crise mundial atual e que mantém a vergonhosa prisão de Guantânamo, invadiu o Afeganistão e já dizimou quase um milhão de iraquianos, na maioria esmagadora, civis. Por que não podemos ter orgulho de ser brasileiros? Eu tenho!